segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

A contradição entre o corpo e o espírito

Povo Brasileiro

Senhores Parlamentares e Governantes da República do Brasil,

"Não só hoje, mas todos os dias devemos lembrar desses covardes assassinatos, cometidos pela
subversiva ditadura cívico-militar, que durante tantos anos torturou e assassinou tantos patriotas
empenhados apenas, em restaurar a democracia violada pela ditadura, que concentrou riquezas e
distribuiu misérias. Tem que acreditar na Pedagogia da Memória, não como vingança, mas, porque
só através do estudo do passado, poderemos entender o presente e preparar o futuro".
(DRAMATURGO - AUGUSTO BOAL)
No dia 02 de fevereiro de 2009 esta casa vai nomear novo presidente, para ocupar a liderança
no Senado; aproveito, para lembrá-los que a integridade e o passado honrado do candidado, é de
extrema importância para decidir os rumos da Nação Brasileira, trilhando o processo democrático
aonde o povo brasileiro sofrido, necessitado, ainda espera pela vida digna, que Getulio Vargas
pretendia oferecer para a cidadania em 1951, sendo impedido pela elite, e pelo regime militar;
suicidou-se, com um tiro no coração, deixando um bilhete para o povo brasileiro perdoá-lo, por não
ter cumprido o prometido;foi condenado, por ter autorizado Jango aumentar em 100% o salário mí-
nimo, instituiu a CLT(Consolidação das Leis Trabalhistas) que hoje 2009, a elite e políticos querem tirar.
A crise que levou o golpe de 1964, começou com a renúncia de Jânio em 1961, após sete meses
de governo. Devido a sua política que se mostrava de esquerda para os militares,empresários,
Aliança Liberal e Intelectuais, perdeu o apoio político que precisava para se manter no governo.
A sua política externa, foi um exemplo. Defendeu com vigor o direito de autodeterminação de Cuba
no momento exato em que os Estados Unidos precisavam de aliados - principalmente do Brasil -
para liquidar o regime cubano. Usou do discurso de independência,conquistando o respeito pela
soberania da sua política externa. Não ficou só nas palavras: reatou relações diplomáticas com os
países do leste europeu; mandou representantes às conferências de Cairo e Belgrado, defendendo
posições hostis aos Estados Unidos: e, talvez o mais importante, apoiou o ingresso da China Po-
pular na ONU . Com o presidente Frondizi, da Argentina, tentou formar uma frente para resistir à
ingerência dos Estados Unidos na política dos países sul americanos. Recusou as pressões de
enviados do governo norte americano (Adolf Berle e Moors Cabot) para "amenizar" sua política ex-
terna.Defendeu a liberação dos povos africanos, opondo-se à política imperialista de Portugal,
apoiada pelos Estados Unidos. Finalmente, condecorou o astronauta soviético Iúri Gagarin e, cul-
minando, fez o mesmo com Che Guevara, o símbolo da Revolução Cubana (Chiavenato,1997,p.10)
Seu vice João Goulart assumiu,também não era visto com bons olhos pelos mesmos que forçaram
Jânio Quadros à renúncia; suas reformas assustaram "as elites", para evitar uma guerra civil João
Goulart renunciou. Os militares usaram como álibi a "guerra fria" para justificar os golpes.
Após a tomada do golpe, todos os que discordavam era "inimigo interno" Quando presas estas
pessoas eram denominadas oficialmente de presos políticos. A violência atingiu a homens, mulhe-
res, muitas delas grávidas, e também crianças. O que diferenciava era a forma de tortura, pois
as mulheres sofriam estupros e eram submetidas a realizar as fantasias sexuais dos torturadores.
A tortura foi indiscriminadamente aplicada no Brasil, indiferente a idade, sexo ou situação moral,
física e psicológica em que se encontravam as pessoas suspeitas de atividades subversivas. Não
se tratava apenas de produzir, no corpo da vítima, uma dor que fizesse entrar em conflito com o
próprio espírito, e pronunciar o discurso que, ao favorecer o desempenho do sistema repressivo,
significasse sua sentença condenatória. Justificada pela urgência de se obter informações, a tortu-
ra visava imprimir à vítima a destruição moral, pela ruptura dos limites emocionais que se assenta-
vam, sobre relações efetivas de parentesco. Assim, crianças foram sacrificadas diante dos pais,
mulheres grávidas tiveram seus filhos abortados. (ARNS,1987,p.43).
Sob o Lema de "Segurança e Desenvolvimento",Médici dá início, em 30 de outubro de 1969, ao
governo que representará o período mais absoluto de repressão, violência, e supressão das liber-
dades civis de nossa história repúblicana. Desenvolveu-se um aparato de "órgãos de segurança",
com características de poder autônomo, que levará aos cárceres políticos, milhares de cidadãos,
transformando a tortura e o assassinato numa rotina (ARNS,1987,p.63)
Um destes órgãos era o Dops (Dep.Ordem Política e Social) que torturava e interrogava,outro órgão
foi criado fora da lei em 1969 a Oban (Operação Bandeirante),composta de várias autoridades do
governo, e que recebia verbas de grandes empresas. Alguns exemplos são: Ford,General Motors,
Ultragás,entre outras. Após sua legalização, se transformou em DOI-CODI (Departamento de Ope-
rações e Informações - (Centro de Operação e Defesa Interna).Fundado em janeiro de 1970, o DOI-
CODI, se transformou em uma máquina de repressão e tortura que não agiu somente no Brasil. De
acordo com Viena (1991,p.217) o DOI-CODI "se infiltrou também na Bolívia,no Chile, Uruguai e na
própria Argentina".Essa forma de repressão não começa somente no governo,tem suas raízes
mais profundas:
A origem dessa política, pode estar no encontro entre oficiais da FEB (Força Expedicionária Bra-
sileira) e dos Estados Unidos, na Itália, durante a Segunda Guerra Mundial. Alí os brasileiros ex-
tasiaram-se diante da eficiência do Exército norte-americano, que os supriu e orientou. Depois da
guerra, os oficiais mais promissores receberam convites para frequentar escolas especiais nos
Estados Unidos, onde assimilaram "idéia modernas", mais condizentes com a realidade da Guer-
ra Fria (Chiavenato,1997,pg.106).
Nos anos 70, os brasileiros são levados a acreditar, que os inimigos se escondem no interior da
nação. É o "inimigo interno".
De abuso cometido pelos interrogatórios sobre o preso, a tortura no Brasil passou, com o Regi-
me Militar, à condição de "método científico", incluindo em currículos de formação de militares. O
ensino deste método de arrancar confissões e informações não era meramente teórico. Era prático
com pessoas realmente torturadas, servindo de cobais neste macabro aprendizado. Sabe-se que
um dos primeiros a introduzir tal pragmatismo no Brasil, foi o policial norte-americano Dan Mitrione
posteriormente transferido para Montevidéu, onde acabou sequestrado e morto. Quando instrutor
em Belo Horizonte, nos primeiros anos do Regime Militar, ele utilizou mendigos nas ruas, para
adestrar a Polícia local. Siviciados em sala de aula, aqueles pobres homens permitiam que os alu-
nos aprendessem as várias modalidades de criar no preso, a suprema contradição entre o corpo e
o hespírito, atingindo-lhes os pontos vulneráveis ( ARNS,1987, p.32).
Outro grave problema se refere às vítimas, que acabavam sendo mortas durante a tortura. Médicos
legistas, forneceram laudos falsos que ocultavam as marcas das torturas.Também justificavam as
mortes em tiroteios. Muitos legistas apresentavam os torturados como se estivessem gozando de
perfeita saúde. Muitos cadáveres foram sepultados anonimamente, e até hoje, familiares não
sabem o que aconteceu com os corpos das vítimas. O objetivo desta ocultação, era o de evitar
que os familiáres constatassem, as marcas das torturas praticadas.
Embora guardassem diferenças nas suas origens, análises e propostas, a maioria destas organi-
zações nasceu nos anos 60, em meio ao intenso debate político e ideológico, que envolveu o cam-
po da esquerda brasileira, e cujos temas centrais foram à atualidade da revolução socialista no
Brasil, e o papel da luta armada no processo revolucionário (HABERT,1994,p.33).
Estes grupos: PCBR, MR8 , VAR-Palmares, VRP, ALN composta de 5 a 6 mil homens, um
contingente insignificante, em relação à população brasileira, estimada em 100 milhões de habitan-
tes em 1970. (CHIAVENATO, 1997,p.117).
A querrilha foi vencida, foram condenados apenas cinco a sete anos de prisão, porque o governo
Médici, não queria alarmar a população. Até hoje, o silêncio sobre estas informações é mantido
pelo Exército. Os atos institucionais foram criados pelo governo, para dar caráter de lei e regra á
repressão e vionência. Com o AI-1,muitos perderam os seus direitos políticos. Em outubro de
1965, surge o AI-2 que deu poder ao executivo para fechar o Congresso quando julgasse necessá-
rio.Em fevereiro de 1966, o AI-3 restringiu ainda mais o direito ao voto popular e ampliou o poder
repressivo dos militares. E em 1968, o AI-5 surgiu para dar todo o poder que o presidente precisa-
va, para aumentar a repressão e tornar impossível qualquer oposição ao governo, pouco depois fe-
chou o congresso por tempo indeterminado.Em 20 anos de ditadura, modos diferentes de tortura:
Pau-de arara: O preso político era obrigado a sentar,abraçando os joelhos e com os pés e as
mãos amarradas. Um cano era introduzido sob os joelhos.Nesta posição, a vítima era pendurada
entre dois cavaletes, com cerca de 1,5 metro de altura, e muitas pessoas não conseguem supor-
tar o suplício e chegam até perder a vida.
Choque elétrico: O torturador usa um magneto de telefone, acionado por uma manivela que confor-
me a velocidade imprimida, fornece uma descarga elétrica de maior ou menor intensidade.Esta
corrente é transmitida ao corpo dos presos políticos pelos pólos positivo e negativo. O choque
elétrico é dado na cabeça, nos membros superiores e inferiores e também nos órgãos genitais
da vítima.
Telefone: O torturador, com as palmas das mãos em posição côncava aplica violento golpe, atin-
gindo ambos os ouvidos da vítima a um só tempo. O impácto é insuportável, em virtude da pressão
e sempre há o rompimento do tímpano, fazendo o torturado perder a audição.
"Afogamento na calda da verdade"; Consiste em afundar a cabeça da vítima em um tambor com
água, urina e fezes, e outros detritos repugnantes. A cabeça da vítima é mergulhada na "calda da
verdade" várias vezes. Depois o preso político é obrigado ficar sem tomar banho por vários dias e
o seu cheiro torna-se insuportável.
"Mamadeira de subversivo": Consiste em introduzir um gargalho de garrafa cheia de urina quente,
na boca aberta do preso, pendurado em um pau-de-arara. Com o uso de uma estopa os torturado-
res comprimem a boca do torturado, fazendo-o engolir o excremento.
Balé no pedregulho: A vítima é colocada, descansa e nua, em temperatura abaixo de zero,sob o
chuveiro gelado, tendo como piso pedriscos ponte agudos,que chegam a retalhar os pés da vítima.
Para amenizar as dores a tendência do preso é bailar sobre os pedriscos e os torturadores ainda
fazem uso da palmatória para ferir as partes mais sensíveis do corpo.
Afundamento com capuz: Consiste em afundar a cabeça da vítima, totalmente encapuzada, em
córregos de água podre ou tambor d'água poluida. O torturado,desesperadamente,tenta respirar e
o capuz molhado se introduz nas narinas, produzindo um mal-estar horrível,levando-o, ás vezes,
a perder o fôlego.
Massagem: O preso é algemado e encapuzado e o torturador faz uma violenta massagem nos
nervos mais sensíveis do corpo, deixando-o totalmente paralisado por alguns minutos. As dores
são horríveis, levando a vítima a um estado de desespero. (VIEIRA. 1991,p.247).
Um balanço ainda precário registra a prisão de 50 mil pessoas. Pelo menos 20 mil sofreram tor-
turas. Além dos 320 militantes da esquerda mortos "desaparecidos".No fim do governo Geisel
existiam cerca de 10 mil exilados. As cassações atingiram 4.682 cidadãos. Foram expulsos das
faculdades 243 estudantes ( Chiavenato, 1997, p.131).
No ano de 1948, a Declaração Universal dos Direitos Humanos é assinada por 51 países em
Assembléia Geral. Este é o documento básico das nações unidas, no qual 192 países são parti-
cipantes atualmente, entre estes o Brasil.
A Declaração enumera os direitos de todos os seres humanos como a liberdade de palavra e de
crença, a justiça e a paz no mundo.Os países aderentes, em especial o Brasil, assinaram que a
partir daquela data se comprometeriam em observar e cumprir os trinta artigos, que visam expor
os direitos de todos os seres humanos no quesito liberdade e dignidade.
No artigo XIX é dito que "Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este
direito inclui a liberdade de sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir in-
formações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras", Isto quer dizer que
todo ser humano tem direito e liberdade para expressar sua opinião política, inclusive sobre deter-
minadas formas de governo, como a presente no BRASIL de 1964 a 1984.
A ditadura militar agia violentamente contra qualquer pessoa . No processo de tortura, foram come-
tidos muitos assassinatos e humilhações. Os Atos praticados pelo governo, também se estende-
ram a amigos e familiáres, que até hoje não sabem o paradeiro dos mortos,em tortura e querrilhas.
Situação esta, que caminha para o fato de indagar que, se hoje após todos estes anos de luta!. da
"ONU?" e com a realidade atual, estas famílias estão recebendo respaldo do governo, no que diz
respeito ao cumprimento destes direitos humanos. É preciso considerar que se trata de um direi-
to para estas famílias ter acesso a informação sobre o que realmente aconteceu naquela época.
Quando muitos desapareceram após terem sido capturados pelos militares, deixando seus fami-
liares sem saber o paradeiro o qual tomaram.
Os perseguidores e presos políticos, não tinham a quem recorrer judicialmente, já que a violência
era imposta pelo próprio Governo brasileiro. Uma violência oficial, por um sistema baseado no
autoritarismo, que não tinha limites nas suas ações. O que lhes importava, era manter o sistema
vigente. Independente da atitude a qual devessem tomar, usaram de muitos meios e artifícios
truculentos, que tratavam a população sem o mínimo respeito aos direitos humanos. "Os homens
que compuseram esse aparato repressivo, aproveitaram-se da impunidade para torturar,matar e
roubar. Vários presos políticos tiveram suas casas saqueadas, seus carros roubados e incorpo-
rados à frota do Dops" ( CHIAVENATO,1997, p.105)
à Declaração dos Direitos Humanos diz, em seu Artigo V que "ninguém será submetido à tortura
nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante". A tortura é um dos crimes mais
cruéis que se pode praticar contra a humanidade. No entanto, no regime militar golpista, a tortura
foi um dos meios que serviu para o governo alcançar os seus interesses políticos. Durante a tor-
tura, as vítimas atingiam um nível de dor e sofrimento, que acabavam admitindo atos e crimes que
não cometeram. Muitas das vítimas foram obrigadas a assinar falsas confissões, e foram à im-
prensa se declarar culpadas e arrependidas. Estas vítimas levantaram determinadas concepções
sobre a esquerda revolucionária, que levaram a população a interpretá-las como monstros que que-
rian destruir a liberdade de todos. Passando assim a identificar no governo, o defensor de suas vi-
das, e no limite até acreditar na retórica de que era defensor dos direitos humanos. Este foi o ní-
vel que a violência militar atingiu: muitos presos, exilados, mortos e desaparecidos. Neste período
o país membro das Nações Unidas, praticou ações crueis e desumanas que atentavam contra os
direitos definitivos na Declaração Universal dos Direitos Humanos. Conforme o Artigo IX que diz:
"Ninguém será arbitrariamente preso, detido, ou exilado". Estes direitos têm que ser transforma-
dos em prática, e não permanecerem somente na teoria. O que na época, da época da ditadura
não foi seguido.
Cobro dos Senhores Parlamentares, uma resposta para este crime que está impune até nossos
dias.
É preciso expor ao povo brasileiro a história do Brasi l! Abertura dos arquivos militáres ! Abertura
dos arquivos da ditadura para que a sociedade conheça, tudo o que passou em toda sua inteireza.
Não é só uma questão de justiça, é um presuposto, para que a sociedade brasileira torne-se
verdadeiramente democrática.
Ainda esperamos do Governo Lula, uma atitude firme e digna, para abrir caminho não apenas ao
direito individual, à justiça (garantia constitucional) mas, também ao direito da sociedade brasileira
de escrever a história da ditadura,( que FHC arquivou como secreto por 50 anos e Lula endossou).
Se uma Audiência Pública e a defesa da punição de militares torturadores são capazes de abrir
uma crise institucional, é porque estamos à beira do caos.
Eu, cidadã brasileira,
Marilda...Oliveira
São Bernardo do Campo,19 de janeiro de 2009